Por vezes nos deparamos com temas cuja origem não conhecemos bem ao certo e pensamos: quem será que inventou isso? Para muitos, esta pergunta poderia ser feita ao tão tradicional casamento entre vinho e os barris de madeira.
Vestígios arqueológicos contam que estes recipientes já eram usados nas antigas civilizações, tendo sido retratados até em monumentos famosos como a Coluna de Trajano, em Roma. Diferentemente de hoje, a sua função era o transporte não só de vinho, mas também de outras bebidas e bens, como sal, no entanto os comerciantes tratavam o vinho como algo altamente perecível que precisava ser vendido rapidamente, pois logo se deteriorava.
O uso para transporte de vinho foi mantido até o final do século XIX, quando, em 1863, Napoleão III encomendou ao químico e microbiologista Louis Pasteur a missão de descobrir a razão de alguns vinhos estragarem tão rapidamente. A surpreendente descoberta de Pasteur foi que a exposição do vinho ao oxigênio estimula o crescimento de bactérias nocivas ao líquido – especialmente a Acetobacter aceti que cria o ácido acético – dando gosto de vinagre o vinho e deixando-o sem condições de ser bebido.
Em contrapartida, o cientista constatou que, em quantidades modestas, o oxigênio modifica positivamente o vinho, sendo necessário preencher totalmente as barricas de madeira para evitar a exposição excessiva ao ar e encontrar o equilíbrio necessário. Tais informações promoveram uma mudança do olhar dos produtores para o uso da madeira, iniciando, assim, a prática de usá-las para repousar o vinho em vez de transportá-lo.
Mas, afinal, o que acontece dentro do barril que torna os vinhos tão especiais? Sem dúvida, a madeira confere aromas e sabores que são apreciados por muitos consumidores, porém, ao contrário do que pensamos, esta contribuição não é o principal benefício que o carvalho oferece ao vinho (apesar de ser um dos mais prazerosos). Antes disso, este processo provoca uma série de reações químicas e físicas que contribuem, primeiramente, para clarificar o vinho, decantando os ‘excessos’ de cor presentes nos vinhos tintos recém fermentados deixando-os com a coloração mais estável.
A segunda razão para o uso da madeira é o fato das moléculas de taninos do vinho se somarem aos da madeira, criando cadeias maiores que dão uma textura mais macia em boca. Tudo isso acontece de maneira controlada devido à entrada moderada de ar no barril, conhecida como “micro oxigenação”.
Apesar da diversidade de madeiras encontradas na natureza, a espécie mais usada é o carvalho branco, por sua madeira ser de fácil manejo e possuir a porosidade exata que permite a entrada do oxigênio na medida certa. As principais florestas de carvalho estão situadas no Hemisfério Norte, sendo as mais famosas localizadas nos Estados Unidos – que aportam grande riqueza aromática ao vinho – e na Europa, que incorpora aromas e sabores mais sutis.
A questão final é se um vinho que tem estágio em madeira é melhor que os demais. Tecnicamente não é melhor nem pior, somente diferente. A razão é que nem todo vinho tem corpo e estrutura suficiente para suportar o peso da madeira. Seria como colocar uma armadura de ferro sobre uma pessoa de anatomia frágil. A armadura seria um peso excessivo que impediria os movimentos daquela pessoa. Já vinhos encorpados, com estrutura forte e, no caso dos tintos, taninos que precisam ser amaciados, a madeira vem em benefício do vinho, criando textura, complexidade e riqueza. Em termos de paladar, será o gosto particular de cada um que vai determinar o melhor ou pior, só fica a sugestão de estar aberto a experimentar regularmente novos vinhos e de estilos diferentes, pois sempre podemos nos surpreender positivamente com aquilo que ainda não conhecemos.
Texto por Bianca Veratti DipWSET
Vinhos:
Viña Alberdi Reserva, La Rioja Alta – Rioja (Espanha)
Château Puycarpin Bordeaux Supérieur – Bordeaux (França)
Rutini Cabernet/Malbec, Rutini Wines – Mendoza (Argentina)
Grande Réserve Cabernet Sauvignon, Château Los Boldos – Cachapoal Andes (Chile)